sábado, julho 21, 2007

Joinville, SC - Off-Tap - Baryshnikov

A matéria abaixo é de Silvia Soter na edição de ontem, 20.07.2007, do Segundo Caderno de O Globo, sobre a apresentação de Mikhail Baryshnikov na abertura do Festival de Joinville:

Bailarino visionário em mais um belo desafio

Hell's Kitchen Dance com Mikhail Baryshnikov: Estrela do balé clássico mostra estar a serviço do futuro na abertura do 25o Festival de Dança de Joinville

Há mais de 20 anos imerso no ambiente da dança cont emporânea, a grande estrela do balé clássico Mikhail Baryshnikov não pára de se colocar em situação de desafio. Artista visionário, também interessado em outras linguagens como a fotografia e o teatro, ele tem hoje como projeto maior colocar-se a serviço do futuro. Sua fundação, a Baryshnikov Arts Center (BAC), vem servindo como celeiro de novos talentos, não apenas na área da dança. A Hell’s Kitchen Dance, companhia jovem que criou e que o acompanha na turnê brasileira, é um dos frutos do BAC. Baryshnikov abriu, anteontem, o 25oFestival de Dança de Joinville, em Santa Catarina, e se apresenta hoje no Teatro Municipal do Rio.

Baryshnikov está em cena com esses bailarinos -- universitários e estudantes em formação --, e isto é uma postura de vida: abrir caminhos e pôr no mercado artistas interessados e interessantes, que, a seu lado, podem conquistar novos espaços.

A escolha dos coreógrafos segue os mesmos critérios. As peças dançadas pela Hell’s Kit chen Dance no Brasil não são de grandes estrelas da criação contemporânea, e sim de dois jovens e talentosos coreógrafos: o francês Benjamin Millepied e a canadense Aszure Barton.

A passagem do tempo está no centro de "Years later", dançada por Baryshnikov, com coreografia de Benjamin Millepied e videografia de Olivier Simola. O bailarino é visitado, através do vídeo, por imagens em pretoe-branco de um Baryshnikov adolescente, desenvolvendo numa sala de dança as competências exigidas pelo balé clássico.

Mas não há uma gota de nostalgia. O passado aparece somente como citação, como bagagem carregada sem esforço por um bailarino que se mostra em plena forma no presente, preciso e delicado em cada gesto, movendo-se com simplicidade, bom humor e maestria.

Num gesto simpático, Baryshnikov convidou três estudantes da Escola do Teatro Bolshoi do Brasil para fazer uma breve participação nessa noite de estréia. Concentradíssimos, eles foram a única presença do balé clássico na noite.

Dançada pelo ótimo William Briscoe, "Rom", que substituiu "Leap to tall" no último momento, joga de forma inteligente com a tensão entre o ritmo da música tradicional húngara e a força deste jovem bailarino negro. Nada sobra e nada falta na peça, criada por Aszure, ou na forma como Briscoe a defende.

A única peça de conjunto, "Come in", de Aszure Barton, fecha a noite. Pela primeira vez, Baryshnikov se integra ao grupo. Aqui também o tempo e memória irrigam a dança. As imagens assinadas por Kevin Freeman criam a atmosfera de desvanecimento que a coreografia seguirá. Nessa travessia de corpos, cheia de silêncios breves encontros, é possível ver a boa qualidade dos bailarinos da Hell’s Kitchen Dance.

No fim da noite, resta a sensação de que o tempo só trabalhou a favor de Baryshnikov. Sua marca está em tudo o que passou pela cena. E, nela, a dança é feita de beleza, sobriedade, elegância e muita delicadeza.

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